terça-feira, 25 de setembro de 2007

VONTADE

VIVER

Viver é Ter o organismo e a mente funcionando.
Viver com qualidade é Ter o organismo e a mente funcionando, aproveitar ao máximo a felicidade e minimizar a infelicidade. É sentir, participar, buscar, refletir, julgar, mudar.
A qualidade da vida é o que sentimos, todo o resto tem como objetivo provocar sentimentos. O que é bom para uns, pode ser ruim para outros. Não importa que a razão indique que o indivíduo não tem motivos para estar infeliz; se ele se sente assim, é isso o que importa e, não, o que a razão diz. O mesmo acontece em relação à felicidade e aos sentimentos em geral.
Os sentimentos têm valores relativos, o ruim é parâmetro para avaliar o bom, o mal é o parâmetro de avaliação do bem, o sofrimento valoriza o prazer e vice-versa. A fome realça o valor da comida, a sede, o da água; a tristeza, da felicidade. Portanto, é evidente a relatividade dos valores no que se refere aos sentimentos, relegando os valores absolutos para segundo plano. A perda do que causou uma grande felicidade, costuma gerar enorme sofrimento.
Não há vida participativa feliz ou infeliz. O que vale é o agora tendo o passado como parâmetro e o futuro como expectativa. São momentos, mais ou menos longos, de felicidade ou infelicidade e a quantidade e duração de um e do outro é que avaliarão se a vida foi mais ou menos feliz.

POSSE E DESEJO
Seus valores
Água é água, mas seu valor depende de sua escassez ou abundância. A luz será muito mais valorizada quando faltar do que quando estiver disponível. A saúde precisa da doença para Ter seu valor ressaltado. A riqueza terá pouco valor se não for comparada à pobreza. O amor terá seu valor reconhecido quando estiver ameaçado ou for perdido. Em fim, costumamos não dar muito valor ao que temos e super-valorizamos o que não temos ou perdemos. Por mais que nos esforcemos, não conseguimos valorizar ao máximo o que temos, se não o perdermos ou sentirmos que está ameaçado.
A razão diz que isso é um absurdo, que deveríamos valorizar ao máximo o que temos e não dar tanto valor ao que desejamos conseguir. No entanto, a emoção teima em provocar sentimentos que contrariam a razão, por isso a insatisfação é a companheira mais constante do ser humano.
Parece que a conquista é o objetivo da vida. Ela se manifesta através da vontade, que provoca o desejo, que busca satisfação. O que já temos não precisa ser conquistado, não provoca desejo e não oferece satisfação. É comum que o valor do que já conquistamos, diminua significativamente em relação ao que lhe atribuímos quando o desejávamos.
O comerciante talentoso, mesmo que inconscientemente, usa essa característica do ser humano, para Ter sucesso nos negócios. Ele age ao contrário, super-valoriza o que tem e procura desvalorizar o que pretende adquirir.
Um comerciante de automóveis, sabe que o cliente pretende trocar o carro que tem, por outro, porque não está satisfeito e pretende satisfazer seu desejo, que é possuir outro carro.
O comerciante aproveita a pré-disposição do cliente de super valorizar o que pretende e desvalorizar o que tem. Para tanto, realça as qualidades do carro que pretende vender e que atendem o desejo do comprador, escondendo os possíveis defeitos, enquanto faz o contrário com o que pretende receber em troca; realçando defeitos e escondendo qualidades.
O cliente sente-se apoiado e reforça sua crença de que estava certo: que precisa se livrar do que tem, por estar defeituoso e adquirir o outro que oferece tantas vantagens. A razão poderá lhe mostrar que a realidade não é bem aquela, mas a emoção trabalhará a favor do comerciante.
Os vigaristas tem talento especial para explorar essa característica em suas vítimas, explorando-as para aplicar seus golpes.
Quando percebemos que poderemos perder o que temos, sentimos seu valor realçado, mas ao invés de nos esforçarmos para reconquistá-lo, tentamos mantê-lo à força, provocando problemas que diminuirão as possibilidades de continuar desfrutando-o e, muitas vezes, causando a perda irreparável.
Em um casal, o ciúme é provocado pela crença de que a exclusividade está em risco. Não importa se esse risco é real ou não, o importante é que o indivíduo se sente ameaçado. Isso acontece porque ele acredita que, para a mulher, ele tem menos valor que o rival, caso contrário, não teria motivos para se preocupar.
A racionalidade indica que ele deveria realçar suas qualidades, minimizar seus defeitos, mostrando à sua amada que ele tem muito mais valor do que o suposto rival, além de investir para reforçar o amor que a companheira sinta por ele e demonstrando o quanto a ama. Isso representaria o reconhecimento de que não valorizara suficientemente o que estava a sua disposição, buscando corrigir o erro cometido.
Ao invés disso, ele prefere acusar a mulher de leviana, o rival de conquistador sem escrúpulos, alegando ser vítima de injustiça. Isso pode ser verdade, mas não o é na maioria dos casos. Ele passa a acusar a mulher, restringindo-lhe a liberdade, cobrando fidelidade, ameaçando. Se a mulher não tinha motivos para repudiá-lo, passa a tê-los e o que não passara de imaginação, pode se tornar realidade, provocando a separação depois de um período de brigas e sofrimento. Isso tanto acontece com homens como com mulheres.
Embora ele se alegue injustiçado, declarando Ter mais valor que o rival, não é o que demonstra. O que importa não é o valor que ele acredite Ter e, sim, o que a mulher lhe reconhece. Ao não se sentir seguro quanto ao valor que a mulher lhe reconhece, o rival imaginário estará sendo super-valorizado, enquanto ele se sente rejeitado.
Enquanto o fantasma do rival não aparece, é comum que o homem não sinta o quanto a mulher lhe é importante. Gaste tempo com outras coisas de menor valor, deixando de aproveitar os prazeres que a companhia dela poderia lhe propiciar. Ao sentir-se ameaçado, ao invés de tentar reconquistar, agride; provocando a perda do que não soube valorizar.

A vontade de conquistar é a energia que propicia o avanço, as descobertas, as invenções, o conhecimento e seu aproveitamento, em fim, o que se chama de progresso. Sem a vontade de conquistar, a vida seria estagnada. Se é verdade que a vontade de conquistar propicia resultados positivos e benéficos para a humanidade e para o indivíduo; não é menos verdade que ela é fonte de grandes males e sofrimento.
Avaliar as vontades, incentivando as positivas e eliminando as negativas; propiciaria a eliminação de grande número de problemas que afligem o indivíduo e a sociedade.
Conseguir valorizar o que já tem, desfrutando-o ao máximo possível, pode aumentar o prazer e felicidade do indivíduo, aliviando a pressão que sofra para lutar por novas conquistas, diminuindo a ansiedade, possibilitando maior reflexão na análise do custo/benefício da nova vontade que pede conquista.
O equilíbrio entre valorizar o que já tem e buscar novas conquistas; pode ser a melhor maneira de aproveitar a vida.
Isso é bastante lógico e sobram argumentos racionais para comprová-lo; no entanto, é muito difícil de ser conseguido na prática. A vontade costuma reagir à razão e, grande parte das vezes, impede que suas recomendações sejam seguidas. Por que isso acontece?

ANSIEDADE
A ansiedade é uma coisa terrível! Ela é ruim até quando o desejado é realizável e causador de grande prazer e felicidade.

Eu estava em Campo Grande sofrendo a maior infelicidade sentida até ali. Tinha convicção de que, se existia inferno, eu estava no pior lugar dele. A alma, ou seja lá o que for, sofria dores agudas e profundas, constantes, sem tréguas, sem um segundo sequer de alívio. Não sentia fome, nem sono; nem mesmo raiva, por maiores que fossem os motivos, eu conseguia sentir. Só tristeza, imensa, constante, dolorida.
A causa fora a perda do grande amor de minha vida. Não perdera só um grande amor, o maior; perdera a mulher que me admirara, respeitara, compreendera; uma companheira solidária, corajosa, sensível, inteligente; uma amiga leal. Não bastasse tudo isso, ela era linda. Foram cinco anos de uma felicidade inenarrável. Não consigo imaginar algo que possa ser comparado a uma perda como essa. Era um valor extraordinário! Não acredito que a perda de uma fortuna, por maior que seja, sirva de parâmetro para comparação. O sofrimento da perda é proporcional à felicidade que aquilo causou. Quanto maior a felicidade conseguida, maior é a tristeza de sua perda. A felicidade que eu tivera, ultrapassara qualquer fantasia que eu tivesse produzido; portanto, a perda foi catastrófica.
Não houve brigas nem discussões. Eu fora para Campo Grande, fazer um trabalho experimental, enquanto ela fora esperar o resultado da experiência, na casa da mãe. Se a experiência desse certo, partiríamos para uma nova etapa de nossa vida em comum, que fora cheia de aventuras. A separação não deveria ser maior do que um mês.
Nos falávamos freqüentemente por telefone. Numa das ligações, ela dissera que conhecera um rapaz e que estava confusa quanto a suas emoções. Disse-lhe para experimentar, buscando segurança no que fosse melhor pra ela. A racionalidade me obrigou a dizer aquilo, embora a emoção me forçasse a entrar pelo cabo do telefone e ir arrebatá-la naquele instante.
O choque foi brutal! Foi como se um raio tivesse atingido a emoção, sobrecarregando a tristeza com uma energia infinita. Senti a terra se abrindo sob meus pés e eu despencasse num buraco sem fim.
Estávamos a mil e duzentos quilômetros um do outro, fisicamente, embora ela estivesse dentro de mim, em cada célula.
A falta de notícias era angustiante, embora eu a sentisse perdida desde o primeiro instante. Imaginava que ela tivesse encontrado um cara com muitas qualidades, que a tivesse valorizado suficientemente, e que tivessem se apaixonado. Isso seria ótimo para ela e, eu, sempre quis o melhor pra ela.
A emoção brigava com a razão, uma briga hercúlea, A emoção queria seu corpo junto a mim, enquanto a razão torcia para que ela tivesse o melhor.
A razão me indicava que eu nada poderia fazer. Ela me conhecia suficientemente, o que dispensava que eu pudesse lhe mostrar algo de novo. Tinha inteligência suficiente para analisar e decidir. Se a emoção a impedisse de racionalizar, não seriam argumentos que pudessem convencê-la do contrário. Portanto, não me restava alternativa, a não ser esperar.
A razão me dizia que deveria esquecê-la até que o veredicto fosse confirmado, que era bobagem ficar sofrendo; que eu deveria tocar a vida, buscando satisfações. Se ela optasse em voltar, a questão poderia ser retomada, analisada e concluída. O melhor a fazer era esquecê-la, libertar a mente e retomar a busca da felicidade.
No entanto, enquanto a razão lutava desesperadamente para me livrar do sofrimento, sua força era extremamente insignificante diante da força da emoção que preenchia a mente com pensamentos sofríveis, desejando vingança, me provocando a tentar recuperá-la a qualquer custo, provocando lembranças do quanto eu fora feliz, não para provocar prazer e, sim, para aumentar o sofrimento, o tamanho da perda. A ansiedade me fazia esperar cada segundo pelo toque do telefone.
Quando muito, eu dormia duas horas por noite e comia meio pacote de miojo em cada refeição, na marra. Enquanto não estava trabalhando, preenchia o tempo escrevendo, derramando lágrimas sobre o papel, juntando letras para formar palavras de desespero, forçando a razão a combater a emoção. Minha mente era um campo de batalha, das mais cruéis, sem descanso, numa luta feroz.
Ao invés de minimizar o sofrimento, a passagem do tempo, o acentuava. Minhas forças físicas diminuíam, enquanto a energia da batalha mental se intensificava a cada dia.
Depois de dois meses, que pareceram séculos, ela me ligou perguntando se poderia voltar. Foi como se o raio que havia me enterrado, surgisse das profundezas e me arremessasse para o infinito do espaço. Depois de um instante de torpor, a ansiedade me provocava a puxá-la pelo cabo do telefone e abraçá-la imediatamente. Ela disse que tinha um assunto pendente para resolver e que me ligaria nos próximos dias para marcarmos a melhor maneira de nos encontrarmos. Disse que me amava e que não via a hora de nos juntarmos.
Minha mente parecia uma corrida de fórmula um onde todos os carros se chocassem, com pedaços pulando por todos os lados. A razão tentava organizar as idéias, enquanto a ansiedade queria solução imediata, pra ontem.
A alegria era imensa, o corpo vibrava intensamente, os pensamentos se atropelavam, a dúvida de se era um sonho ou realidade dominou por algum tempo. O medo de que ela pudesse mudar de idéia ganhou espaço e uma nuvem negra dominou o pensamento.
No entanto, a esperança de recuperá-la foi maior. Era realidade, ela dissera que queria voltar, repetiu várias vezes. Que assunto pendente seria o que ela tinha que resolver? Ela se negara a dizer, alegando que contaria quando nos reuníssemos. Que poderia ser?
Pelo menos, agora, os pensamentos ruins tinham a companhia dos bons e se alternavam descontroladamente. A razão me recomendava que me agarrasse aos bons, mas que considerasse a possibilidade de ela desistir, preparando-me para a retomada da tragédia. A mente era um caldeirão em ebulição.
Ela ligou dois dias depois, para combinar nosso encontro. Sugeri que ela fosse pra São Paulo, pois estava com nosso carro; que eu iria de ônibus, nos encontraríamos lá e voltaríamos juntos. Ela alegou que não tinha dinheiro para ir até São Paulo. Fiquei de fazer um depósito na sua conta bancária. Ela ficou de ligar no dia seguinte para confirmarmos o dia da viagem, uma vez que aquele assunto ainda não fora resolvido.
Já era noite, fui até o centro da cidade para fazer o depósito. Nas duas agências que havia ali, os caixas eletrônicos não estavam funcionando. Bateu o desespero!
No dia seguinte, fui até uma agência do banco e fiz o depósito.
Ela me ligou dizendo que seu cartão magnético apresentara defeito e que não conseguira tirar o dinheiro, o que só poderia ser feito em São Paulo, na agência de sua conta. Ela ficou de tentar conseguir um empréstimo e me ligar quando tivesse resolvido a pendência.
Ligou dois dias depois, dizendo que estava liberada, mas que não conseguira o empréstimo. Eu já não agüentava, estava a ponto de explodir! Decidi ir buscá-la na cidadezinha, onde ela estava na zona rural. Disse-lhe que pegaria o ônibus na noite seguinte, iria para São Paulo, pegaria o outro ônibus e que, no Sábado pela manhã a encontraria na cidadezinha, no ponto de ônibus, na beira da estrada.
Na manhã seguinte, comuniquei aos donos da empresa em que estava trabalhando, que viajaria naquela noite, por isso precisaria sair um pouco mais cedo. Um deles, que era de São Paulo, e estava voltando pra lá, me ofereceu carona. Saímos naquela mesma manhã. A ansiedade era tanta que eu tinha impulsos de apertar o pé do motorista no acelerador.
Eu estava indo ao encontro da felicidade, do paraíso, fugindo do inferno. Deveria estar radiante, curtindo o deleite que seria aquele reencontro, no entanto, sentia angústia, medo de acordar e verificar que não passara de um sonho. Eu me beliscava, mas não adiantava. O medo de que ela pudesse desistir me agoniava. A viagem era interminável. As horas corriam, enquanto a distância se arrastava, lentamente, teimando em não ser vencida.
Chegamos em São Paulo no começo da noite. O primeiro ônibus para a cidade onde ela estava, só sairia na manhã seguinte. Fui para a casa de meus pais, liguei para a rodoviária, para saber o horário do ônibus, mas ninguém atendia. Tentei até altas horas e nada.
A ansiedade fazia a angústia aumentar, como se isso fosse possível. Eu sabia que o ônibus saia por volta das sete horas, mas não tinha certeza. Só havia aquele pela manhã e outro no final da tarde. Se não conseguisse ir naquele, ela poderia pensar que eu houvera desistido. Esse pensamento me provocava pânico.
As cinco e meia da manhã, eu já estava na rodoviária, comprei a passagem e esperei as duas horas que faltavam para o embarque. Os nervos do meu corpo, desde o menor até o maior, tremiam, vibravam como as cordas de um instrumento. Eu andava de um lado para o outro, comprei um jornal, tentei lê-lo, mas era impossível; a mente se negava a registrar as palavras.
O ônibus parou na rodoviária de São José dos Campos. Eu havia combinado que, como não tinha como ligar pra ela, que ela me ligasse no celular, por volta das oito e meia, pois eu estaria numa região em que havia sinal. Depois disso, o sinal não existiria e não teríamos como nos comunicar, caso algum imprevisto surgisse.
Eu segurava o celular na mão, com tamanha força que parecia que o esmagaria e o dissolveria com o suor que jorrava dela. Aliviei a pressão e enxuguei-o, mas ele não tocava.
O ônibus partiu, chegou na região onde não havia sinal e o toque da campainha continuava mudo. O pensamento de que ela desistira tomou conta e o domínio do desespero foi uma tarefa hercúlea.
Desci do ônibus e olhei para o ponto vazio. Senti aquele buraco imaginário se abrir sob meus pés. Permaneci estático, com o olhar fixo naquele ponto de ônibus, não sei por quanto tempo. Pensei em procurá-la, afinal a cidadezinha era minúscula. A possibilidade de darmos voltas desencontradas aumentou meu pavor. No entanto, não poderia ficar ali, imóvel, presa daquela angústia terrível.
Desci uma rua e, na primeira esquina, encontrei dois conhecidos. Quando lhes perguntava se a haviam visto, vi nosso carro se aproximando, com ela ao volante. O mundo desapareceu, só ficou aquele carro cor de vinho, aqueles olhos verdes e o cabelo loiro. Fui até o carro como um robô, sem correr, a passos lentos, com medo de que fosse uma miragem.
Entrei no carro, ela dirigiu até a estrada, parou no acostamento, nos abraçamos e beijamos longamente, entre lágrimas que expulsavam a angústia represada.
A cidade sofrera um apagão telefônico e nenhum aparelho funcionava, por isso ela não conseguira me ligar. Tudo contribuiu para que não se perdesse nem um único segundo de agonia.
Não teria sido problema encontrá-la, mesmo que estivesse na casa de parentes na roça. Eu poderia Ter pego um taxi e procurado-a. O problema é que o motivo de ela não estar me esperando, poderia Ter sido a desistência e, a ansiedade, colocava esse como o único motivo possível.
Eu me empenhei profundamente e acionei todas as forças disponíveis para fortalecer a razão e a moral, no entanto, a emoção dominou o tempo todo, massacrando a racionalidade e desconsiderando a moral.

A ansiedade é uma componente da vontade, grande causadora de sofrimento e terrível empecilho para a racionalidade. É muito difícil de ser dominada, provocando pressa, forçando a tomada de atalhos, que geram enormes atrasos e, muitas vezes, impossibilitam atingir o desejado. A ansiedade é um câncer da vida.


VONTADE
Segundo Schopenhauer, ao tomar consciência de si, o homem se experiencia como um ser movido por aspirações e paixões. Estas constituem a unidade da vontade, compreendida como o princípio norteador da vida humana. Voltando a olhar para a natureza. O filósofo percebe esta mesma vontade presente em todos os seres, figurando como fundamento de todo e qualquer movimento. Para Schopenhauer, a vontade corresponde à coisa em si, ela é o substrato último de toda realidade.
A vontade, no entanto, não se manifesta como um princípio racional, ao contrário, ela é o impulso cego que leva todo ente, desde o inorgânico até o homem, a desejar sua preservação. A consciência humana seria uma superfície, tendendo a encobrir, ao conferir causalidade a seus atos e ao princípio do mundo, a irracionalidade inerente à vontade. Sendo deste modo compreendida, ela constitui, igualmente, a causa de todo sofrimento, uma vez que lança os entes em uma cadeia perpétua de aspirações sem fim, o que provoca a dor de permanecer algo que jamais consegue completar-se. Segundo tal concepção pessimista, o prazer consiste apenas na supressão momentânea da dor, esta é a única e verdadeira realidade.

Para os filósofos Santo Agostinho e Descartes, vontade e liberdade são a mesma coisa: a faculdade através da qual somos dignos de louvor, quando escolhemos o bom, e dignos de reprovação, quando escolhemos o mau.
Agostinho e Descartes concordam em que o fato de nós humanos termos vontade nos torna responsáveis pelas nossas decisões e ações. A dimensão moral do homem decorre do fato dele ter vontade.

As teses defendidas por Shopenhaur, Descartes e Santo Agostinho, nos chamam a atenção para a importância da vontade no ser humano e nos provocam a refletir sobre a influência que ela exerce na vida dos indivíduos.
Ter vontades satisfeitas, gera felicidade. Quando não satisfeitas, geram infelicidade. Portanto, é natural que a tentativa de satisfação de vontades seja tentada. Ansiedade e motivação poderão interferir significativamente na tentativa de satisfação de vontades.
Vontades podem ser criadas ou eliminadas pelo indivíduo?
Há indicativos bastante fortes de que, pelo menos, parte das vontades não dependem do indivíduo, nem para surgirem, nem para serem eliminadas. Tão fortes quanto as vontades de conseguir, são as de repudiar.
Por outro lado, é evidente que podemos agir sobre as vontades, incentivando-as ou reprimindo-as.
Quem nunca sentiu grande vontade de esmurrar alguém que o tenha prejudicado? De comprar algo que não podia pagar? De comer ou beber algo que sabidamente lhe faria mal? Quem nunca sentiu vontade de ficar na cama, num dia frio e chuvoso, deixando de ir ao trabalho ou à escola? Não eliminamos tais vontades, simplesmente as reprimimos, baseados na racionalidade ou na moral.
Repudiar é ter vontade de negar, de não fazer, de evitar. Quem não repudia a perda, o prejuízo, a dor?
É evidente a existência de vontades que demandam satisfação com tanta força, que o indivíduo não consegue opor-se-lhe, por mais que se esforce por consegui-lo. É o caso de algumas paixões e das dependências (de drogas, por exemplo). Há pessoas capazes de verdadeiras loucuras, por não resistir aos apelos da paixão. Dependentes de drogas, quando o sofrimento pela falta dela e pelas conseqüências da vida em que está metido, é extremamente mais forte que o prazer pelo uso; esforçam-se para manter-se abstêmios, mas não conseguem, por mais que se esforcem.
É possível identificar se a força do indivíduo é pequena para resistir a uma vontade ou a força da vontade é que é maior, ainda que a dele seja bastante grande?
Existem métodos infalíveis para resistir a qualquer vontade?

ANSIEDADE E MOTIVAÇÃO
Para evitar interpretações errôneas, vamos definir ansiedade e motivação:
ANSIEDADE: Força que nos impele a conseguir rapidamente a satisfação de vontades, desconsiderando razão, moral ou quaisquer outros valores.
MOTIVAÇÃO: Força que nos move a buscar satisfação de vontades, dando-nos força para tentar, disposição para agir, esperança de conseguir e paciência para esperar.
Tanto uma como a outra, nos impele a tentar satisfazer vontades. A ansiedade, no entanto, é egoísta, irracional e irresponsável, desconsiderando os riscos e prejuízos que sua satisfação poderá causar. Só a sorte pode nos livrar das armadilhas que essa busca de satisfação pode nos aguardar. A ansiedade não ajuda em absolutamente nada, é fonte de sofrimento e causa de prejuízos.
A motivação, ao contrário, é a fonte de energia da vida, nos possibilita enfrentar as maiores dificuldades como se fossem simples obstáculos que podem ser vencidos. Ela permite que busquemos satisfação, respeitando valores, com responsabilidade, mantendo a dignidade, sem culpas, em busca de prazer e felicidade.
Buscar e valorizar motivação, lutando contra a ansiedade, é indispensável para buscarmos satisfação de vontades, que nos propiciem felicidade.
Não podemos criar motivação, nem eliminar ansiedade, pura e simplesmente. Elas são acessórios das vontades. Cabe-nos lutar para valorizar a motivação e lutar contra a ansiedade. É preciso ter consciência do que nos é possível e do que não; para não desperdiçarmos forças, dirigindo-as para onde poderão propiciar-nos melhores resultados.
A ansiedade está presente na dependência, como a de drogas e de jogo; em todas as paixões, causando angústia, forçando satisfações inconseqüentes, cobrando o que não é devido. Ela causa atropelos, desperdício de oportunidades, perdas irreparáveis na dignidade, na moral, na auto-estima. No aprendizado, por exemplo, ela nos força a ter pressa, não dando o tempo necessário para fixar e compreender o conhecimento, causando perda de tempo, obrigando-nos a voltar N vezes para reaprender o que já acreditávamos saber. Ela nos acena com possibilidades de felicidade imediata, que na maioria das vezes é ilusória; desviando-nos do caminho que poderia nos levar à felicidade intensa e mais duradoura.
A ansiedade não é algo que se possa desligar. Ela acontece na maioria dos indivíduos, se não em todos. O que varia entre os indivíduos é a intensidade em que ela acontece. Num mesmo indivíduo, o nível de intensidade pode variar no decorrer do tempo. Há casos em que ela pode ser considerada patológica e a psiquiatria e a psicologia se consideram aptas a enfrentá-la. O importante é saber que ela existe, que pode ter força maior do que a disponível no indivíduo para enfrentá-la e que é preciso opor-se a ela, tentando evitar os males que pode causar.
A ansiedade impede a construção de sonhos, pois estes são constituídos de vontades cuja satisfação sabemos não ser possível a curto prazo, que exigem tempo e trabalho para serem realizados.
Os sonhos são importantes na medida que alimentam boas esperanças de felicidade. Muitas vezes, o sonho oferece felicidade e, não raro, a satisfação da vontade que o gerou, causa frustração. Daí a grande importância dos sonhos: eles significam esperança, exigem paciência, motivam, fornecem alguma felicidade só pela perspectiva de que um dia se realizem, e não são ansiosos.
Nunca é demais lembrar que a felicidade é o objetivo da vida. Que ela depende da satisfação de vontades, que são afetadas por motivação e por ansiedade. Que não depende de nós criá-las ou eliminá-las, pois são autônomas e de origem misteriosa. Portanto, só nos resta apelar para a racionalidade e para a moral, tentando administrar a vontade, em busca de satisfações que propiciem felicidade, reagindo a vontades que causem sofrimento e prejuízos. Podemos dizer que qualidade de vida é resultado da administração de vontades.

SOFRIMENTO
Há pessoas com extrema resistência ao sofrimento enquanto, outras, não suportam nem os menores.
A resistência à vontades, à sua satisfação, implica em sofrimento. Quanto maior a dificuldade para suportar sofrimento, maior a dificuldade para resistir à vontades.
Um indicativo da força da vontade, é a submissão do indivíduo a riscos e sofrimentos muito grandes, para tentar satisfazer sua vontade. Um dependente de drogas enfrenta o risco de ser preso, ferido e, até, morto, para conseguir satisfazer a vontade de consumir a droga; suportando, ainda, grandes humilhações e total perda da dignidade. Crianças, mesmo sabendo que sofrerão bastante, arriscam-se a satisfazer vontades que sabem proibidas.
Se algumas vontades forem inevitáveis e sua força irresistível, é preciso encontrar meios de enfrentá-las, sabendo-se que ameaças de sofrimento não serão suficientes, para enfrentá-las. Pode haver casos em que só nos reste atenuar-lhe os efeitos e preparar-se para sofrer as conseqüências.
Uma coisa parece evidente: as vontades tem escala de valor e prioridade. A que se apresente mais forte e prioritária enfraquecerá a necessidade de satisfação das outras. Se pudermos valorizar e priorizar uma vontade benéfica, em detrimento de outra, causadora de problemas, será uma opção para vencer a indesejável.
Outra coisa a ser considerada, é a possibilidade de permanência da vontade não satisfeita, que ficou eclipsada pela força e prioridade de outra. O fanatismo religioso, por exemplo, tem propiciado que dependentes de drogas se mantenham abstêmios. No entanto, enfraquecida a fé ou tendo o indivíduo acesso à droga, a vontade pode ressurgir com toda a intensidade.

DISCIPLINA

Como conseguir que alunos se motivem a estudar? Como evitar que vontades ansiosas causem grandes prejuízos a ele e à sociedade?
Será que recompensas por comportamentos adequados e pequenos castigos pelos inadequados, podem ser solução para o comportamento de todas as crianças?
Pelo exposto acima, indivíduos são influenciados por vontades em intensidades diferentes, têm capacidade de resistir a sofrimento, também variável, portanto, é muito difícil estabelecer padrões de comportamento para premiar ou castigar, suficientes e necessários para uma coletividade.

O respeito a direitos e deveres é um bom parâmetro para estabelecer disciplina. Pode-se dizer que a disciplina é necessária para que a satisfação da vontade de um, não violente o direito de outros. Quem tente desrespeitar direitos alheios, deverá ser contido, por meios capazes de evitar que isso aconteça, sem ultrapassar a medida suficiente. Que limites podem garantir que um indivíduo respeite direitos alheios, limitando-se à suficiência? Será possível padronizá-los?

COMPREENSÃO DA VONTADE
Um aluno, antes de mais nada, é um indivíduo sujeito a influência da vontade. Se considerarmos a força possível com que ela pode tentar a satisfação, poderemos verificar a influência disso na vida dele. O que a educação tem feito para informá-lo disso e oferecer conhecimentos para que ele possa interferir na vontade?
Que métodos existem para agir sobre a vontade do aluno, possibilitando controlá-lo e mostrando-lhe o que pode fazer para administrar sua vontade, analisando-a racionalmente, possibilitando aproveitar o bom e defender-se do mau, incentivando ou reprimindo a satisfação?
Um aluno que reaja à educação, que a repudie, dificilmente poderá ser influenciado por ela e aproveitar o que ela pode oferecer-lhe. Nessa situação, os conhecimentos que forem tentados incutir-lhe, terão valor desprezível, terá sido trabalho desperdiçado.
Pelo exposto, a vontade deveria receber a maior atenção dos responsáveis pela educação, objetivando potencializar suas características benéficas e conseguindo meios de combater o que ela pode provocar de mau.


VONTADE, O GATILHO DA VIDA
A vontade é o início de todo processo que culminará com a ação do indivíduo. Pode-se dizer que ela é que inicia e alimenta a vida ativa. Portanto, a maneira mais eficaz de influenciar um indivíduo é agir sobre sua vontade. Se pudéssemos incrementar a vontade do positivo e do bom, neutralizando a vontade do ruim e pernicioso, conseguiríamos uma diminuição significativa nos problemas da humanidade. A questão é saber como.
Reunidos em assembléia, os ratos concordaram que a melhor solução para não serem surpreendidos pelo gato seria pendurar-lhe um guizo no pescoço. O tilintar do guizo os alertaria de que o malvado se aproximava. Ótima idéia! Mas... quem colocaria o guizo?


FACILIDADE INICIAL
Tentar realizar vontades e desejos o mais rapidamente e sem qualquer esforço; seria o ideal. No entanto, é comum que o caminho que pode levar à satisfação, seja dificultado por vários obstáculos. Há vontades e desejos que podem ser satisfeitos através de dinheiro ou conhecimento. Tanto um como outro precisam ser conseguidos e, normalmente, exigem trabalho e empenho.
Há casos em que o exigido é o desprendimento, abrir mão de alguma coisa de que dispomos ou a que estamos acostumados.
Dificilmente sentimos vontade ou desejo do que já temos e está disponível.
A tendência à facilidade inicial, provoca o indivíduo a atropelar os obstáculos ao invés de buscar elimina-los ou contorná-los, por meios coerentes e legítimos.
A opção pela facilidade inicial, tende a gerar problemas futuros, que a falta de racionalidade não permitiu prever, podendo tornar a realização de uma vontade ou desejo em resultados desastrosos.
Há indivíduos que desconsideram toda e qualquer dificuldade para a satisfação de um desejo e tentam conseguir seus objetivos irresponsavelmente, sem se dispor a sacrifícios e trabalho, muito menos respeitar direitos alheios. Não sei se isso é uma característica inata ou resultado do convívio social, principalmente da educação.

Depois dessas considerações, não é difícil perceber que dados significativos têm sido desprezados por estudos e análises que têm objetivado solução para muitos problemas. Muito do que alegam ser conhecido, continua sendo um mistério. O pior não é não saber e, sim, acreditar que se conhece o que continua desconhecido. Isso dificulta que o conhecimento continue a ser buscado.


VONTADE
A vontade gera uma emoção, que provoca um sentimento.
Além de necessidades fisiológicas, são os sentidos e a memória que informam à vontade o que pretender.
A moral poderá convocar a razão a considerar a vontade, avaliando-a, oferecendo caminhos para a satisfação e indicando dificuldades; ou deixar que a emoção comande as ações.
A razão avaliará se a vontade tem condições de ser satisfeita de imediato, a médio, longo prazo ou se ela está mais para utopia do que para realização. Indicará que caminhos podem ser trilhados, considerará os valores do indivíduo, propiciando que ele decida se vale a pena, ou não, lutar pela satisfação.
Se a razão não intervier, a vontade só poderá ser freada pelos valores morais. Se o indivíduo desprezar os valores positivos, a vontade terá total liberdade para buscar satisfação pela via mais rápida, sem a menor disposição para enfrentar dificuldades. Mesmo que sejam inúmeros os exemplos de que isso não atinja a satisfação e que, quando atinge, ela é efêmera; esse tipo de indivíduo insiste em optar por esse caminho, desprezando a experiência que mostra o quanto é prejudicial.

Se a vontade do indivíduo não puder ser controlada através da razão e de valores positivos, dificilmente se conseguirá evitar as conseqüências prejudiciais de seus atos. A vontade é a grande motivadora para realizações, mas é, também, a desencadeadora dos maiores problemas do indivíduo e conseqüentemente, da sociedade.
A vontade de ganhar dinheiro é comum a praticamente todo indivíduo. A maneira como cada um tenta consegui-lo é que os diferencia.
O trabalho é o meio mais usado par conseguir o objetivo. Isoladamente, dificilmente ele propicia mais que o necessário para a sobrevivência. O que se associa a ele é que fará o diferencial.
Trabalho braçal
Talento + trabalho
Talento+estudo+trabalho
Talento+estudo+racionalidade+trabalho
Talento+estudo+racionalidade+sorte+trabalho
Quanto maior e mais eficiente for o que se associa ao trabalho, menor será o esforço necessário.
Facas, machados, foices, serrotes, em fim, ferramentas de corte, quando cuidadosamente preparadas e afiadas, diminuirão em muito o esforço exigido no trabalho, com resultados de melhor qualidade. Para tanto é necessário investir trabalho na preparação das ferramentas.
Um músico talentoso terá facilidade para tocar um instrumento. Se estudar o que outros já descobriram a respeito do instrumento e o que ele pode propiciar; conseguirá muito mais qualidade em um tempo bem menor, do que se tentasse descobrir esses detalhes por experiência própria. O estudo tem como objetivo poupar tempo e esforço na tentativa de descobrir o que já é conhecido. Sem talento, o músico poderá aprender a tocar um instrumento, porém com mais dificuldade e menor qualidade.
Se a razão for desconsiderada e a moral não oferecer restrições, o indivíduo tentará conseguir satisfação atropelando tudo e todos, sem preocupação com os males que possa causar. Poderá optar por roubar ao invés de trabalhar para conseguir o pretendido, por exemplo.
As informações acima são de conhecimento da maioria das pessoas, no entanto, a falta de compreensão as impede de usá-las para evitar ou resolver problemas. Que esperar de pais e educadores que defendem o que acham certo e criticam o que consideram errado, sem compreender os porquês de tais aceitações e rejeições? Grande parte das pessoas julga, aceita ou rejeita, com base em preconceitos que nunca questionou e que, portanto, desconhece sua validade ou não. Isso é causa de muito do que sofrem, no entanto, por ignorância, esforçam-se para que os filhos e alunos aceitem o que defendem, mas não compreendem. É comum que quando questionados, por filhos ou alunos, sobre a validade desses preconceitos, os adultos se neguem a discuti-los e tentem impor a aceitação. O autoritarismo é um grande dificultador da educação.
Como dito acima, a vontade costuma rejeitar as recomendações da racionalidade, insistindo para ser satisfeita. Muitas vezes os riscos de prejuízos são aceitáveis e vale a pena experimentar para se livrar da pressão da vontade. Outras vezes, no entanto, os prejuízos podem ser significativos, ocasionando custos elevadíssimos para benefícios irrelevantes. Nesses casos a vontade deve ser refreada a qualquer custo. Principalmente os pais devem atentar para isso, não cercear experiências que possam ensinar com riscos aceitáveis e impedir aquelas cujo custo é inaceitável. Para tanto, pode ser necessário usar a autoridade quando não possível convencer pela argumentação. É preciso diferenciar autoridade responsável e autoritarismo comodista.


VONTADE
A vontade aparecia, sem que se soubesse como, vasculhava a memória e os sentidos em busca do que desejar. Identificado o objetivo, se empenhava em tentar satisfaze-lo. A moral tentava interferir, assim como a razão. Ela, no entanto, fugia delas quando percebia que pretendiam dificultar ou impedir seu objetivo. Quando lhe eram favoráveis, abraçava-se a elas, aproveitando tudo que ajudasse na satisfação.
Era grande geradora de pensamentos parasitas, servindo-se de todo tipo de artifício para conseguir seu objetivo. Criar pensamentos obsessivos, dificultar a razão e a moral, envidavam seus maiores esforços.
Quando a tentativa de satisfação se mostrava frustrada ou, até, verdadeira tragédia, ela sumia sem mais nem menos, deixando o problema para a razão, a emoção e a moral.
Quando razão e moral eram muito fracas, logo ela aparecia novamente, com outro objetivo, com o mesmo desejo de satisfação, como se não tivesse nada a ver com o fracasso anterior. O ciclo se repetia até que a satisfação fosse tentada de novo.
Os desejos não satisfeitos ficavam depositados, perdendo força no decorrer do tempo. Alguns deles ficavam perambulando pela mente, despercebidos pelo consciente, gerando vários problemas, principalmente, na emoção e, não raro, no próprio funcionamento do organismo. Aliás, esse era um dos artifícios usados pela vontade ativa: gerando mal estar orgânico, provocado por interferência no sistema biológico.
Hoje já não é tão comum, mas antigamente, principalmente entre os mais humildes, era comum a chamada somatização, distúrbios orgânicos causados por vontades insatisfeitas. Era comum que, anormalidades no corpo, principalmente manchas, fossem atribuídas a desejos insatisfeitos da mãe, durante a gestação. Isso fazia com que maridos saíssem de madrugada em busca de satisfazer desejos, os mais extravagantes, anunciados pela mulher. Esses desejos dificilmente se dirigiam para coisas simples, que estivessem à mão. Na maioria das vezes, eram coisas raras e difíceis de encontrar. Dá pra desconfiar que o principal objetivo do desejo era sacrificar o marido.
Crianças que não tinham seus desejos satisfeitos, tinham febre, diarréia, vômitos, geravam vermes no intestino, etc. O objetivo da maior parte desses desejos eram comidas e bebidas.
DEPENDÊNCIA
Era comum a presença de vontades obsessivas, dominadoras, resistentes a qualquer tipo de repressão. Os objetivos dessas vontades eram os mais variados: chocolates, doces, aparência corporal, dinheiro, poder, paixão, álcool, drogas, apropriar-se do que não lhe pertencia, etc.
Pessoas não admitiam ser vistas com aparência que não julgassem convenientes. Essas pessoas costumavam gastar grande tempo cuidando da aparência, tendo dúvidas tremendas sobre como se pentear, que tipo de roupa usar, que calçado, que gestos e expressão corporal adotar, etc.
Crianças que tinham verdadeira fobia de sentir-se sós, ainda que a mãe estivesse próxima, mas fora de seu campo visual. Outras que choravam desesperadamente porque tinham perdido a chupeta. Havia as que sofriam terrivelmente, inclusive com distúrbios orgânicos, quando perdiam um animal de estimação.
Pessoas com verdadeira compulsão por comprar. A vontade não era pelo que estivesse à venda, mas pelo ato de comprar. Essas pessoas chegavam a comprar o que não podiam pagar, nem necessitavam, o que gerava grandes problemas.
Pessoas obesas, com grande vontade de emagrecer, não conseguiam porque a vontade de ingerir alimentos, principalmente doces e chocolates, superava a vontade de mudar a estética. A vontade de ingerir alimentos e guloseimas era muito maior que a de emagrecer, provocando efeito contrário: aumento do volume e peso do indivíduo, gerando mal estar físico e psicológico, sucumbindo à vontade maior.
Em outras pessoas a vontade de atingir uma estética desejável, as levava a parar de comer, de se alimentar o mínimo indispensável, superando a fome ou qualquer vontade por alimentos e guloseimas. Não raro, algumas dessas pessoas adoeciam por falta de energia biológica. Mesmo assim, não conseguiam se opor à vontade de emagrecer.
A vontade de ser notado, chamar a atenção para si; levava o indivíduo a apelar para qualquer coisa que, segundo sua imaginação, poderia lhe render a satisfação pretendida.
No passado era assim. Continua sendo.
Roupas extravagantes, tatuagens, cortes e cor de cabelo, agressividade, prática de esportes radicais, corridas e manobras radicais com carros e motos nas ruas, atentado ao pudor; entre tantas outras apelações com o objetivo de “aparecer”.
Eu fui fazer paraquedismo e vôo livre, mais pela vontade de reconhecimento e admiração, do que pela emoção obtida. Na época eu não sabia disso, mas hoje estou convicto de que a causa principal foi essa.
Muita ajuda que prestei, muitas coisas que arrisquei, muito do que fiz durante a vida; devem Ter sido motivados mais pela vontade de “aparecer” do que outra coisa qualquer.
Para muitos intelectuais, o conhecimento adquirido foi motivado pelo desejo de reconhecimento e de causar admiração. Eles fazem questão de florear tudo, fazer crer que detém grande conhecimento e de alta qualidade; o que é muito difícil ser conseguido por simples mortais. Supervalorizam seu conhecimento e não perdem oportunidade de ostentá-lo.
Muitos escritores, escrevem, mais para mostrar sua erudição do que para transmitir com clareza suas idéias. Escrevem textos ininteligíveis, cheios de palavras raras, tentando complicar ao máximo a leitura e, principalmente, o entendimento. É a literatura discriminatória que exclui os que não sejam tão “eruditos” quanto o autor. Quando o objetivo é transmitir idéias, elas devem ser colocadas da maneira mais simples possível, para que possam ser compreendidas sem maiores esforços, dispensando erudição do leitor ou do ouvinte.
A vontade de causar admiração, ser reconhecido, aplaudido e elogiado; pode superar qualquer outro valor ou vontade, dominando o indivíduo, obrigando-o a fazer o possível e o impossível para satisfazer essa vontade. É uma verdadeira dependência.
Há os que, não tendo coragem nem disposição para trabalho e sacrifícios; optam por destacar-se através da ficção. São os grandes mentirosos, que se esforçam para parecer o que não são. Contam façanhas que teriam feito, tentam demonstrar conhecimento que não têm, capacidades inexistentes, coragem que não conhecem, em fim, são produtores de uma fantasia de si mesmo, tentando fazer crível o que não passa de pura mentira. É comum que esse tipo de indivíduo viva sendo ridicularizado pois, mesmo demonstrando grande capacidade criadora; costuma exagerar, acelerando a descoberta de seu embuste. O ridículo é menos sofrível, para ele, do que o não ter sua vontade de “aparecer” satisfeita. Essa vontade o domina e o impede de contrariá-la, mesmo que ele tenha consciência dos prejuízos que isso lhe causa.
Acreditando que suas mentiras surtem efeito, mente para justificar seus atos, para encobrir seus erros, em fim, mente. Ele, mais que os outros, acaba acreditando nas próprias mentiras, enganando-se, vivendo fantasias como se fossem realidade. Tudo estava ali, na sua mente, atrás do tapume. A vontade usando a razão para inventar mentiras e argumentos que as justificassem. A memória registrava como verdadeiras muitas das fantasias criadas. A própria emoção era manipulada, ajudando na interpretação que ele apresentava. Ele era um autêntico marionete, manipulado pela vontade, que usava as outras características mentais.
O tipo de dependência mais reconhecido como tal, é o de consumo de álcool, drogas, fumo e jogo. Nem todos que experimentam ou, até, usam, se tornam dependentes. Dificilmente alguém é dependente de todas elas, embora possa ser usuário e praticante de todas. Um indivíduo pode ser dependente do fumo e, mesmo usando cocaína, maconha e álcool, possa deixar de usá-los sem problemas. Outros podem ser dependentes de jogo e só fumar e beber socialmente, podendo usar drogas esporadicamente. No entanto, se ele experimentar algo de que é potencialmente dependente, se tornará escravo de uma vontade irresistível.

Uma das vontades mais forte e persistente é a de resolver problemas num passe de mágica, sem esforço e, se possível, imediatamente. Esperar por milagres ou qualquer tipo de ajuda divina, sem fazer o que estiver a nosso alcance, é tentador. Como seria bom que todos os problemas pudessem ser resolvidos assim, não é?

MISTÉRIO
A vontade comanda nossas vidas e, muitas vezes, ela independe de nossa participação consciente para interferir nela, tanto no aparecimento, quanto na sua manipulação. O que a provoca, lhe dá tanta força e dificulta que seja influenciada pela razão?
No filme: “Forrest Gump, o contador de estórias”; o protagonista é um homem simples, obstinado, desempenhando atividades que lhe são impostas, com determinação e sem reclamações. Ele não questiona, não é prepotente, nem egoísta; simplesmente faz, como que comandado externamente, com muito poucas emoções e um mínimo de racionalidade. Na guerra, ele carregava os companheiros nas costas, mesmo contra suas vontades, objetivando salva-los, demonstrando o quanto valorizava a vida. Considerando o sonho do amigo, morto na guerra, que desejava ser capitão de um barco pesqueiro de camarões; empregou todas suas economias para comprar um barco e tentar realizar o sonho do amigo. Sua vontade era realizar a do amigo, sem ambição, sem qualquer outra motivação.
A total dedicação ao que fazia, associada ao talento, tornou-o grande corredor e jogador de tênis de mesa. Fazia isso naturalmente, sem pretensões, sem outros motivos que a vontade de faze-lo.
Quanto às emoções, demonstrava amor pela mãe e pela Jenny, sem exigências, totalmente disposto a se doar. Sentiu grande amizade por Bubba e pelo tenente, sendo leal e demonstrando total dedicação. Ele não se frustrava, porque não desejava o que não podia. Alcançou grande sucesso, não porque o desejasse, mas como conseqüência do que fez, pela simples vontade de faze-lo, obedecendo a comando externo a ele, que agia em seu interior.
Não sei se a intenção do autor foi ressaltar a influência do mistério na vida. No entanto, o filme mostra essa possibilidade e a vida mostra indícios muito fortes de que isso acontece.
A dependência escraviza o indivíduo, impossibilitando-o de reagir a essa vontade. Pessoas cometem verdadeiros suicídios morais, econômicos, emocionais; dominados por vontades a que não conseguem reagir e impedir.
É fundamental tentar agir sobre a vontade, incentivando-a ou reprimindo-a, com base na razão. No entanto, é preciso considerar a possibilidade de não conseguir resistir-lhe, preparando-se para sofrer as conseqüências e, se possível, minimiza-las.
É importante perceber o quanto é difícil tentar fazer algo de que não se tem vontade. Para que algo possa ser tentado, sem grandes sacrifícios, é importante encontrar uma vontade que o justifique. É possível fazer uma grande caminhada, que não gostaríamos de fazer, se o que nos espera lá for objeto de nossa vontade.


VONTADE: Ela é uma força muito grande que age sobre o indivíduo. Não é raro que ela o domine totalmente. que o force a viver exclusivamente para tentar satisfaze-la, desprezando a racionalidade e as conseqüências. Ela age como a emoção, provocando sentimentos e forçando o indivíduo a agir para satisfaze-la. Pode-se considerar que ela seja um componente da emoção ou que ela aja sobre esta, que provocará os sentimentos. Ela motiva o indivíduo para realizações benéficas, mas pode escraviza-lo, gerando dependências maléficas e causadoras de sofrimento. O problema é a sua força que, muitas vezes, suplanta a do indivíduo para opor-se a ela. Os valores considerados como bons pelo indivíduo costumam rejeitar algumas vontades que os contrariam. O dependente de drogas não admite que o seja, que é totalmente dependente delas. O cleptomaníaco, também não consegue admitir sua condição. O ladrão, o corrupto, o vigarista, entre outros marginais; agem em desacordo com os valores que defendem em sociedade, o que os impede de aceitar que ajam contra os princípios e valores que defendem, obrigando-os a negar sua condição e, quando isso for impossível, tentar justificar seu procedimento, alegando causas muito fortes. Isso os obriga a interpretar papéis que camuflem a verdade, Muitas vezes, essa interpretação é encenada para eles próprios, que não conseguem aceitar seus erros.
O que leva o indivíduo a roubar é sua vontade de Ter dinheiro ou qualquer bem. Sua incapacidade para consegui-lo por meios lícitos, causada pela preguiça e pelo comodismo; levam-no a delinqüir. O que propicia ao indivíduo continuar a ser safado, são as desculpas que ele inventa para suas safadezas. A vontade gera a dependência de drogas e de outras coisas. A falta de dinheiro para satisfazer o vício, leva-o a manipular, mentir, roubar e procurar todo e qualquer meio para satisfazer sua vontade sem Ter que trabalhar ou se submeter a qualquer sacrifício normal. É interessante observar que essa situação lhe causa grandes problemas e sofrimento, em troca de pequenos tempos de prazer. É um custo muito alto para um benefício pequeno. A maioria dos dominados pela vontade vivem se frustrando, não conseguindo satisfaze-la, acumulando prejuízos materiais e morais. Isso não os faz compreender o quanto são escravos da vontade, nem lhes proporciona perceber a necessidade de mudanças. Isso mostra que as coisas são fruto de nossa interpretação e não uma realidade concreta. Para o dependente da vontade seus pensamentos e ações são o certo e não os erros que o senso comum e a racionalidade apontam. Para eles, o pequeno benefício pode valer o alto custo. O socorro, nas situações piores, propicia-lhe continuar sem mudanças. A falta de socorro poderia proporcionar-lhe verificar que o custo seria muito maior que o benefício, provocando mudanças. Será?

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