sábado, 23 de agosto de 2008

A EDUCAÇÃO ERA MELHOR

A EDUCAÇÃO ERA MELHOR
Há anos venho escutando que a educação, antigamente, era melhor.
Havia muito menos recursos e poucos tinham acesso à escola. Mesmo assim, as pessoas eram mais capacitadas, produziam mais e geravam menos problemas.
É verdade. É tão evidente que não há como negar. No entanto, me perguntei: o que aquela educação tinha de diferente?
As matérias e os conteúdos não eram em quantidade maior do que agora. Pelo contrário, os recursos eram bem menores, muito mais limitados.
A grande diferença está no comprometimento dos indivíduos, tanto educadores quanto educandos. Os educadores se empenhavam em ensinar e, os educandos, em aprender. Havia um compromisso com o objetivo e as pessoas o assumiam com responsabilidade. Isso acontecia menos por consciência e mais por princípios morais, pela aceitação de valores como verdadeiros paradigmas.
A mudança não está nos conteúdos, nas teorias, nas técnicas de ensino, nos recursos disponíveis e, sim, na personalidade dos indivíduos, na disposição para enfrentar dificuldades, para lutar pelos objetivos.
A questão seguinte foi: Por que aconteceu essa mudança nos indivíduos?
Valores assumidos como verdadeiros paradigmas, que deixaram de sê-lo. Autoritarismo que impingia esses valores, considerando-os inquestionáveis.
Crianças eram obrigadas a obedecer. Autoridade de pais e professores era inquestionável. Respeitar os mais velhos era obrigação, merecessem esse respeito ou não. Nada de democracia.
Sacrifico infantil e adolescente, como investimento para formar adultos responsáveis e com maior autonomia.
Crianças trabalhavam pra ajudar no orçamento da família e pra aprenderem profissões, responsabilidade e compromisso. A maioria delas nunca deixou de brincar, até mesmo porque, criança brinca com qualquer coisa e em qualquer condição; inclusive no trabalho.
Será que as crianças, hoje, são mais felizes do que eram antes?
Uma coisa parece evidente: exceções serviram de base para as reformas realizadas no tratamento das crianças e adolescentes. Para tentar eliminar o trabalho escravo, eliminou-se a possibilidade de qualquer tipo de trabalho. Para tentar evitar violência e maus tratos, proibiu-se atitudes necessárias para corrigir distorções. Em fim, para proteger a criança e o adolescente, escancarou-se a formação de adultos deformados e geradores de inúmeros problemas.
Várias teorias têm sido experimentadas e colocadas em prática, sem que se perceba mudança significativa de rumo.
Parece que o problema não está no conhecimento ou na maneira com que ele é transmitido e, sim, na personalidade dos indivíduos envolvidos: pais, professores, alunos e comunidade em geral. Em indivíduos egoístas, prepotentes e sem disciplina; dificilmente algum método ou teoria terá sucesso na formação de cidadãos competentes e responsáveis.
O direito de um termina onde começa o de outro. As crianças e adolescentes aprenderam com muita facilidade a exigir direitos, mas reagem a respeitar o direito alheio e, principalmente, assumir a responsabilidade por seus deveres.
Será que só existem duas possibilidades: autoritarismo e violência, ou libertinagem e desrespeito? Não será possível associar as coisas boas dos dois regimes e combater os males identificados?
É preciso dar mais atenção à formação do indivíduo, da sua personalidade, do seu caráter, da compreensão de valores e da importância da disciplina. Sem isso, dificilmente o indivíduo poderá dar utilidade ao conhecimento conseguido.
A pior violência que se pode cometer é permitir que o indivíduo acredite saber o que não sabe, ter direitos que não tem, poder o que não pode; ser auto-suficiente, quando depende da convivência para sobreviver.
Infelizmente o mau uso da autoridade por governos ditatoriais, usando e abusando da violência física e moral para submeter os indivíduos a sua vontade, pintou de negro a disciplina, transformando-a em vilã. A vítima foi condenada! O desrespeito a direitos é a maior evidência de indisciplina. A disciplina foi o grande bode espiatório dos desmandos do autoritarismo.
Violência NÂO! Irresponsabilidade, MENOS AINDA!

quarta-feira, 18 de junho de 2008

A EDUCAÇÃO DO EDUCADOR

A EDUCAÇÃO DO EDUCADOR
Talvez, o maior problema da educação esteja no fato de que dão mais importância às teorias e métodos que ao objetivo principal e à individualidade dos envolvidos (professores e alunos).
O objetivo da educação deveria ser propiciar ao indivíduo aproveitar a felicidade que a vida propicia e evitar os dissabores que ela impõe. O conhecimento compreendido é ferramenta e arma para interferir na vida.
A felicidade é o objetivo da vida. Ela é propiciada pela satisfação de vontades. Se a felicidade depende da satisfação de vontades, o inverso não é tão verdadeiro. A satisfação de vontades nem sempre causa felicidade e, muitas vezes, gera sofrimento e prejuízos. A compreensão disso é fundamental e o conhecimento existente demonstra claramente essa afirmação, propiciando aproveitar o bom e minimizar o mau.
O conhecimento é um facilitador. É como o lubrificante que facilita o movimento, evitando atritos e desgastes desnecessários. Ele é de extrema importância para o funcionamento da máquina, bem como para sua durabilidade, no entanto, ele não tem utilidade em si mesmo. Sem ele a máquina não funciona como poderia, no entanto, sem a máquina o lubrificante não tem qualquer serventia.
O conhecimento acumulado pela humanidade é imenso. A dificuldade de comunicação e de armazenamento ocasionou a perda de muito conhecimento existente no passado. Muitos pesquisadores, hoje, quebram a cabeça tentando compreender como chineses e romanos, por exemplo, criaram, desenvolveram e construíram máquinas, embarcações, ferramentas e armas. Não se tem certeza sobre os métodos empregados para transportar o material e construir as pirâmides de Egito, entre outras obras monumentais. Isso demonstra a importância de armazenar o conhecimento.
Tão importante quanto o conhecimento é a sua acessibilidade. O armazenamento deve ser criterioso, permitindo o acesso na medida da necessidade. Portanto, é fundamental que quem precise acessar o conhecimento saiba que ele existe e como poderá ser encontrado.
A função mais importante da educação é mostrar ao indivíduo que o conhecimento é um facilitador da vida, o quanto ele pode facilitar felicidade e quantos dissabores pode evitar. Que para acessa-lo é indispensável a comunicação e conhecer os critérios de busca.
A comunicação permite que quem detém o conhecimento o transmita de maneira clara e objetiva; enquanto, quem o recebe, o entenda sem distorções. Ela pode se dar pela escrita, fala, gestos, desenhos, etc. A comunicação se dá através dos sentidos e sentimentos.
Devido à imensa quantidade de conhecimento existente, ele deve estar armazenado de maneira lógica, que permita ser acessado quando necessário. O sistema lógico que permita isso deve ser conhecido tanto por quem armazena como por quem pretenda acessa-lo.
Para que o indivíduo possa servir-se do conhecimento existente é necessário que saiba encontrá-lo e entendê-lo. Prepara-lo para isso deve ser o objetivo da educação.
Conhecimentos não devem ser considerados como verdades absolutas. Eles são fruto da capacidade humana, que é falível, portanto, sujeita a erro. Além disso, a recepção da informação está sujeita a interpretação que poderá divergir da do transmissor, distorcendo-a.
O conhecimento deve ser questionado até que seja compreendido e aceito. Para isso é necessário o uso da racionalidade, do pensamento lógico que considere os dados, os analise e permita conclusões.
A educação deve propiciar ao educando:
- Reconhecer a importância do conhecimento e sua utilidade.
- Reconhecer suas características individuais: deficiências, talentos e capacidade para controlar suas vontades.
- Capacidade de comunicação, recebendo e transmitindo com clareza.
- Capacidade para buscar conhecimento.
- Desenvolver o raciocínio lógico.
- Consciência de que não existem verdades absolutas, da falibilidade do ser humano, de que, se não é possível evitar erros, eles podem ser fonte de aprendizado.
- Compreender que a premissa para aprender é reconhecer não saber.
O PROFESSOR
O professor, além de ser um transmissor de conhecimentos básicos, deve ser um provocador de curiosidade, um orientador de caminhos e um guia seguro que leve o discípulo à auto-suficiência para buscar o conhecimento necessário.
Educar é mostrar que a vida é cheia de contradições e o quanto o conhecimento racionalizado pode ajudar a enfrentá-las. Todos gostam de saber, mas relutam em aprender o necessário para obter o saber.
Um indivíduo adoraria saber dirigir um carro ou pilotar um avião, no entanto, reluta em aprender o conhecimento necessário para isso. Se não for forçado a aprender o necessário, poderá tentar dirigir ou pilotar, sem estar capacitado para tal, correndo grande risco de frustrar-se, causar prejuízos e sofrimento.
O mesmo que acontece com o desejoso de ser motorista ou piloto, ocorre com a maioria dos que precisam de conhecimento. A relutância não está no saber, que eles até desejam; está no trabalho necessário para aprender, adquirir e compreender o conhecimento.
A maioria dos alunos gostaria de saber resolver problemas matemáticos, físicos, químicos, biológicos, etc.; no entanto, relutam fortemente a aprender os axiomas, regras, postulados, leis naturais, em fim, o conhecimento que lhe possibilita saber o que lhe interessa.
Quem não gostaria de escrever, falar corretamente, compreender tudo que ouve e lê? O que ele rejeita é o trabalho necessário para aprender ortografia e gramática. Se fosse possível injetar-lhe o conhecimento, sem que ele tivesse que se esforçar, o aceitaria de bom grado.
Quanto maior o desejo de saber, menor será o esforço necessário para aprender e maior será a disposição para esforçar-se em consegui-lo. Se isto é verdade, o inverso é tão verdadeiro quanto. Portanto, provocar desejo é fundamental, o que é possível despertando curiosidade, que poderá atiçar a motivação. Com motivação tudo é muito mais fácil.
Se o desejo de saber não for suficiente para provocar o aprendizado, serão necessários meios que o forcem. Impedir dirigir automóvel ou pilotar avião a quem não tenha aprendido o necessário, é uma maneira de forçar o aprendizado. A força, de qualquer tipo, deve ser o último recurso a ser usado na educação. Despertar desejo, demonstrar a necessidade e mostrar que o benefício compensa o custo; devem ser tentados ao extremo.
As teorias educacionais são importantes, os métodos, também; no entanto, como qualquer conhecimento, não são absolutos e devem ser adaptados sempre que isso for necessário e possível. O objetivo principal é conseguir que o indivíduo se sirva do conhecimento para a melhor qualidade de vida. É importante não exigir-lhe mais que o necessário, nem permitir-lhe negligenciar o indispensável.
Na escola, o responsável pela condução do aluno ao saber é o professor. Não há política, nem teoria, nem método, que impeçam os malefícios causados por um professor relapso, desinteressado e incompetente. Por outro lado, o bom professor superará até as dificuldades que o sistema possa lhe impor, conduzindo seus discípulos da melhor maneira possível.
A disponibilização e transmissão do conhecimento pode ser feita por vários meios, inclusive eletrônicos; no entanto, não há o que possa orientar e conduzir o aluno melhor que um bom professor. É ele quem interagirá sensivelmente com o aluno, percebendo-lhe as particularidades, ajudando-o a superar umas e aproveitar outras, incentivando, corrigindo; esforçando-se para que consiga o máximo possível. Isso é impossível a qualquer outro meio que não o relacionamento humano, embebido de sensibilidade e racionalidade.
O aluno precisa ser orientado a aproveitar sua potencialidade e conviver com suas deficiências. Não é razoável forçar demais o aluno a aprender o que tem dificuldade para assimilar, deixando de orienta-lo a buscar o conhecimento que facilitará o desenvolvimento para o que tem talento. A identificação do que é melhor para o indivíduo depende da interação sensível e racional entre ele e o orientador. Dificilmente uma máquina poderá realizar essa tarefa.
Se muito tem sido investido em pesquisa de políticas, teorias e métodos, o mesmo não aconteceu na formação e valorização do professor. Quando esse erro será corrigido? Quando se compreenderá que políticas, teorias e métodos, são ferramentas que, se não compreendidas e aceitas pelo professor; serão mal utilizadas e, ao invés de sucesso, produzirão fracassos?
Durante muitos séculos a humanidade acreditou que a solução dos seus problemas só era possível através da religião, de um poder divino. A partir do surgimento da ciência, muitos passaram a acreditar que ela possibilitaria a solução dos problemas, principalmente pelo progresso que conquistava.
Os problemas principais, que mais infelicitam o ser humano, continuam insolúveis. Não seria hora de investir no próprio ser humano, propiciando-lhe condições para que use sua capacidade e contribua para possibilitar o que ciência e religião não conseguiram?
Se o ser humano conseguir utilizar o conhecimento existente com racionalidade e sensibilidade, poderá resolver muitos de seus problemas e aprender a conviver com os inevitáveis.
Um dos maiores problemas do ser humano é não conseguir usar o conhecimento existente em seu benefício. Boa parte da culpa por isso cabe à educação e, o resto, a interesses escusos que se servem da ignorância para explorá-la.
O problema é que, muitas pessoas encarregadas de resolver os problemas da educação, não o compreendem e, outros, são beneficiários do atual sistema. Portanto, as dificuldades para mudanças não são poucas, nem pequenas.

As pessoas têm características individuais diferenciadas. Alguns armazenam e recuperam dados da memória com facilidade, enquanto, outros, tem grande dificuldade para isso. Enquanto alguns têm facilidade para raciocínio lógico, outros enfrentam dificuldade para consegui-lo. Há os que têm grande dificuldade de administrar suas vontades, enquanto, outros, a dominam grande parte delas sem dificuldade. Fisicamente, uns têm tendência a engordar, outros são magros por mais que comam ou sejam sedentários; há altos, baixos, fortes, fracos; uns com sentidos aguçados, enquanto, outros, os têm deficientes. Em fim, é grande a variação de características entre os indivíduos.
Em uma sala de aula, dificilmente se encontrarão três alunos com a maioria das características iguais. Talvez não se encontrem nem dois. Isso implica na impossibilidade de a escola guiar o aluno por todos os passos que ele precisa caminhar na busca do melhor aproveitamento de sua potencialidade. Reconhecendo essa impossibilidade, resta oferecer-lhe as condições que lhe permitam enfrentar essa caminhada, participando ativamente dela ao invés de esperar passivamente que o guiem em todos os passos.
Se as características são diferentes, é evidente que as necessidades também o serão. No entanto, algumas necessidades são fundamentais a qualquer um:
-COMUNICAÇÃO. Quanto maior a capacidade de comunicação, maior o universo de conhecimento que poderá acessar e maior facilidade terá para compreendê-lo. Ouvir, falar, escrever, ler, desenhar, gesticular, olhar, degustar, etc. Reconhecer as limitações e as potencialidades é fundamental para aproveitar ao máximo a capacidade de comunicação.
-AUTOCONHECIMENTO. Quanto mais o indivíduo conhecer suas características, maiores as chances de defender-se das negativas e aproveitar as positivas. Saber lidar com dificuldades e limitações, aproveitar talentos é o melhor que alguém pode fazer. É importante que ele saiba que ninguém é melhor ou pior, como um todo. Cada um é melhor em algumas coisas e pior em outras. O valor é sempre relativo e depende basicamente dos sentimentos que desperta ou de análises lógicas. O que tem grande valor para alguns, pode não ter qualquer valor para outros. Portanto, não há como dizer que alguém é melhor ou pior que outrem. A única evidência é que são diferentes. O importante é que cada um seja o melhor possível, que não desperdice capacidades e não pretenda o que não pode.
-SOCIEDADE. É praticamente impossível ao ser humano viver isoladamente. Ele é um ser social. O convívio em sociedade implica na relação entre os diferentes. Interesses diferentes tendem a gerar conflitos se não houver limitações. Leis e regras tentam estabelecer limites para evitar conflitos, no entanto, o fundamental é que os indivíduos tenham consciência de direitos e deveres; que o direito de um termina onde começa o de outro. É tão natural querermos o máximo, quanto impossível consegui-lo. O direito de outros limita a satisfação pretendida por nossa vontade. O respeito a direitos e deveres é o que se chama de disciplina.
MEIO AMBIENTE. Perceber o meio ambiente em que vivemos é muito importante para que possamos aproveitá-lo, evitando causar-lhe agressões desnecessárias.
RACIOCÍNIO. Não importa a capacidade racional do indivíduo, o importante é que ele saiba usá-la da melhor maneira.
CONHECIMENTO. O conhecimento é uma ferramenta capaz de facilitar a vida. É importante identificar o conhecimento necessário, saber buscá-lo, compreendê-lo e usá-lo. O valor do conhecimento está relacionado com sua utilidade. Ostentar conhecimento como um valor em si, não é razoável.
Se a educação conseguir que o indivíduo consiga se COMUNICAR bem, CONHECER-SE, conviver harmoniosamente em SOCIEDADE, conhecer e respeitar o MEIO AMBIENTE, conseguir usar a RACIONALIDADE e buscar o conhecimento necessário; terá cumprido seu papel.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

A fácil solução dos problemas alheios

Assistindo, ontem, o filme “Dois filhos de Francisco”, ficou evidente a inconsciência de um pai que não mediu conseqüências . Por gostar de música sertaneja, imaginou que os filhos pudessem conseguir sucesso cantando.
Ele não tinha nenhum dado que indicasse que as crianças tivessem algum talento para o canto. Era só um desejo.
Numa festa na cidadezinha, o filho mais velho disse que iria cantar no show que acontecia lá. Subiu no caminhão, que fazia as vezes de palco, e embora o violeiro repetisse muitas vezes a introdução, ele permaneceu travado até conseguir começar a cantar. Não era bem um canto; se parecia mais com uma gritaria. Como prêmio, o pai comprou-lhe uma gaita de boca. O menino não tinha a menor idéia de como tocá-la e fazia um barulho danado.
Depois de um bom tempo, o filho começou a tocar músicas na gaita.
O Francisco vendeu tudo o que produzira no sítio, inclusive um revolver que fora herança de seu pai; para comprar uma sanfona e um violão para os filhos. O detalhe, é que ele devia dinheiro ao sogro pela aquisição de um arado. Ao saber que o genro havia comprado os instrumentos musicais, com dinheiro que poderia ter sido usado no pagamento da dívida; o sogro classificou-o de maluco e irresponsável. Normal, né?
Abandonar o sítio e aventurar-se na cidade, em busca de chances para os filhos cantar, não é atitude considerada normal pela maioria das pessoas, muito pelo contrário: costuma ser classificada como loucura.
Entregar os filhos a um empresário que, embora bem falante e manipulador, evidenciava ser um “picareta”; foi um risco grande demais, também deplorado pela maioria das pessoas. O risco corrido se evidenciou com a morte do filho mais novo, da dupla, num acidente automobilístico, numa viagem depois de uma apresentação.
Se por um lado, Francisco agiu irresponsavelmente e inconscientemente; por outro, incentivou, empurrou e fez o que podia para que os filhos conseguissem sucesso. O que pesa mais nesse julgamento?
Ficou evidente a influência do mistério. A caminhada contribuiu para o aprimoramento musical, mas o sucesso só aconteceu depois de muito tempo. A persistência pode ser considerada como motivo para o sucesso, no entanto, um número enorme de pessoas foi tão persistente quanto eles e continuaram no ostracismo.
Será que se tivessem esperado, sem perseguir o objetivo com tanta insistência, teriam chegado onde chegaram?
Teriam tentado no mento certo?
Teriam tido capacidade de suportar os sofrimentos e decepções?
Se ao invés do sucesso, os dois filhos tivessem morrido no fatídico acidente; como o Francisco seria considerado, hoje?
Difícil julgar, né?
A super-proteção é comum. A total irresponsabilidade, também. No entanto, qual a medida de proteção e atrevimento recomendável? Será que existe esse parâmetro?
O que é evidente, é que não existe super-proteção capaz de evitar todos os problemas e sofrimentos; nem atrevimento que garanta sucesso nos objetivos. Por outro lado, verificamos sucesso conseguido sem maiores esforços, enquanto grandes persistências, esforços e sofrimentos, resultam em fracassos e decepções. Com base nessas evidências, você se atreveria a recomendar ou agir segundo alguma estratégia que te pareça coerente?

Super-proteção é causada por amor, medo, prepotência, egoísmo, desconfiança, desrespeito e covardia.
É natural tentar proteger quem se ama, afinal, o que ela possa sofrer, causará sofrimento a quem a ama. Quem ama, não tenta proteger a pessoa amada só pelo que ela possa sofrer, mas, também, pelo que ele próprio possa sofrer por isso. Algumas vezes, a maior motivação é a proteção de si próprio. É o medo.
A falta de coragem impede o super-protetor de considerar os benefícios que o risco pode propiciar à pessoa amada, super-valorizando o sofrimento próprio, acovardando-se e optando por impedir que ela arrisque em busca de benefícios, prazer e felicidade.
A prepotência, o considerar que sabe o suficiente e que os outros não sabem nada, faz com que o super-protetor se dê o direito de julgar e determinar o que é melhor, sem considerar o que outros possam pensar, principalmente, quem pretende proteger. Ele não considerará os benefícios possíveis a quem pretende proteger, mas só os custos, principalmente os que possam atingir a si próprio. Isso caracteriza, além da prepotência, o egoísmo.
A desconfiança exagerada, causada por comodismo, covardia e egoísmo, torna o risco inaceitável quando não houver promessa de benefícios próprios consideráveis. Nesses casos, considerando que não terá benefícios pessoais, o super-protetor optará por impedir que o pretenso protegido se arrisque em busca de benefícios próprios. Desconfiará de tudo e de todos e usará essa desconfiança para argumentar contra qualquer tentativa.
O super-protetor não tem o menor respeito por quem pretende proteger, não considera sua capacidade, sua vontade, seu direito e, muito menos, as forças que possam influenciá-lo. Não se dá ao trabalho de refletir e analisar, simplesmente tenta impedir.
A intenção de proteger é muito importante, pode evitar prejuízos e sofrimento; possibilitar a busca de caminhos mais promissores, em fim, ajudar a conseguir sucesso, prazer e felicidade, evitando riscos desnecessários. No entanto, é preciso respeitar o direito alheio, a capacidade do indivíduo, sua inteligência, emoção e, principalmente, as forças misteriosas que o afetam. Antes de tentar impedir, é importante ser humilde, solidário, compreensivo, analisando custos e benefícios com isenção, contribuindo para a melhor decisão. Evitar desvalorizar o direito alheio, enquanto super-valoriza o próprio.
É bastante grande o número de pessoas que alegam conhecimento e compreensão, aconselhando, indicando soluções e, até, proibindo; sobre o que desconhecem, não se deram ao trabalho de analisar nem refletir, muito menos, discutir. Falam com tamanha segurança e convicção que, os menos avisados, são enganados com a maior facilidade. Verificando com um pouco mais de cuidado, é fácil perceber o quanto essas pessoas são incapazes de orientar sua própria vida. Seus argumentos são conflitantes, contraditórios; o que não as impede de defender, com ênfase, as maiores ambigüidades; demonstrando seu desconhecimento, incompreensão, domínio de preconceitos, de vontades e da emoção, enquanto fica claro a total ausência de racionalidade.
É muito difícil estabelecer os limites entre o que é proteção e o que é abuso de poder, prepotência e egoísmo. Não existem parâmetros confiáveis que possam ser usados com segurança, o que nos obriga a considerar cada caso, refletir, analisar e decidir.
Não é fácil! Embora, muitos, nem se dêem o direito de qualquer reflexão e optem por proibir e tentar impedir a qualquer custo que o suposto protegido tente o que quer que seja; é preciso considerar que isso é um abuso inaceitável, talvez, pior que a despreocupação irresponsável.